Bodas de prata no cume do Abrolhos

Bodas de prata no cume do Abrolhos

17 de junho de 2018 0 Por Natan

Bodas de Prata de Montanhismo. Essa era uma data a ser comemorada. São 25 anos na montanha, totalmente ativo e cada dia mais apaixonado pelo que faço.

No dia 10 de julho de 1993 meu pai, Jorge Luiz, me levou para conhecer o Marumbi. Queria me levar para uma aventura como ele teve quando na infância, na década de 60, seu cunhado o levou para subir o Abrolhos.

Meu pai que muito me ensinou e educou também me apresentou a maior paixão que é o montanhismo. Na fragilidade e inocência do seu conhecimento de montanha, me levou para subir o Abrolhos, uma das montanhas mais vistosas do Marumbi.

Subida totalmente amadora, mas um grande desafio para a dupla de pai e filho. Na época eu tinha apenas 12 anos, baixinho, magricelo, e quase sem nenhuma musculatura desci do trem com meu pai na estação do Marumbi em um dia de céu azul, coisa rara nessa região.

Na época o local ainda era terra de ninguém, não tinha parque ou qualquer registro para identificar a dupla que estava pronta para subir. Uma mochila para cada um e mais uma bolsa de mão era o que tínhamos para levar em minha primeira caminhada na montanha. Dentro dessas quatro bolsas carregávamos o que na teoria seria de extrema necessidade para passar a noite no cume do Abrolhos: Uma barraca canadense com estrutura de ferro, um colchão de solteiro enrolado em um cobertor quente e pesado, que parecia um grande “paiero” que levávamos pendurado como uma grande bolsa, duas garrafas de vidro de Coca-Cola, roupas extras e comida que daria para alimentar mais 2 pessoas tranquilamente.

Não lembro a hora que começamos a subir, lembro apenas que o dia estava muito bonito, céu azul com uma temperatura bem agradável. Nessa época não tinha nenhum tipo de controle de visitantes. Qualquer pessoa subia e descia a hora que queria.

A subida foi muito lenta, meu pai carregava a maior parte da carga enquanto sobrava apenas uma pequena mochila para eu carregar. Um pouco acima do cruzo da Ponta do Tigre com o Abrolhos paramos para mais um lanche e descanso, estávamos tão cansados que acabamos dormindo por alguns minutos sentados em cima das mochilas.

Foi uma subida sofrida e demorada até o cume do Abrolhos. Era final do dia e nossa próxima missão era encontrar um lugar para montar a barraca para descansar.

Achamos um lugar que cabia apenas a barraca. Lembro de trocar de roupa e sentar no fundo da barraca para esperar meu pai preparar os sanduíches. Ele estava revirando as coisas atrás dos talheres, e de repente ele achou um saquinho com os utensílios de cozinha todos limpos e organizados, mas na hora reclamou: “Que merda hem! Tua mãe mandou essas merdas aqui tudo de plástico, se eu precisa-se cortar alguma coisa mais pesada com essa faquinha de plástico não ia ter jeito”. É claro que agora tinha chegado a hora daquela Coca-Cola deliciosa, tudo bem que não estava gelada, mais uma Coca essas horas é muito bom!

Cansados, de roupa trocada e barriga cheia foi inevitável a gente cair no sono, não sei que horas eram quando adormecemos, mas no meio da noite acordamos com alguns barulhos estranhos em torno da barraca. Meu pai tentava iluminar em volta e só dava para escutar algum bichinho por entre os arbustos tentando se esconder da luz. Eram cuícas. Nessa hora meu velho me chamou para olhar lá fora.

Lembro nitidamente desse momento quando sai para fora da barraca. A noite estava bem clara, um pouco fria, com apenas uma leve brisa. Ali eu presenciava o meu primeiro mar de nuvens no cume de uma montanha. Tudo estava branco abaixo de nossos pés, só os picos das montanhas apontavam para fora daquele tapete que parecia um grande lago branco. De tempos em tempos, parecia que havia uma pequena erupção entre as nuvens, era como se alguma coisa por debaixo do “tapete branco” fizesse força e do nada explodia um buraco entre as nuvens que logo voltava a fechar.

Ficamos ali por horas olhando o céu com estrelas cadentes, aquele mar de nuvens que se mexia com suas pequenas erupções num silêncio que eu ainda não tinha presenciado.

Pela manhã uma alimentação bem nutritiva, com mais sanduíches e refrigerante. Isso não faltava rsrs! O colchão de solteiro enrolado como um baseado foi difícil de levar para cima, já para descer foi muito mais fácil, só precisávamos ir jogando para baixo. O único problema era quando o embrulho pegava o caminho errado da trilha, e lá ía meu pai caçar o entulho.

Chegamos na estação do Marumbi logo depois do almoço. Ali esperando o trem e sem muito o que fazer, meu pai resolveu pegar o trem na estação de Engenheiro Lange que fica um pouco mais abaixo da onde estávamos.

Chegando em Curitiba minha mãe já esperava ansiosa a dupla de aventureiros, quando me viu veio logo me abraçando e ajudando com as malas. Minha mãe logo me perguntou, “ E aí filho, gostou de ir para o Marumbi?”  E eu logo respondi: “Nunca mais!!!”. Resposta essa, motivo de piada dentro da família até hoje.

 

Para comemorar os 25 anos dessa subida levei para o Marumbi meu pai e meus dois filhos. Pegamos a trilha do Abrolhos já logo pela manhã, agora sem muita coisa para levar, apenas o básico para passar o dia na montanha.

Pensei que o meu pai ditaria o ritmo da caminhada, mas para minha surpresa, o sedentário do grupo que precisávamos ficar esperando acabou sendo o Gabriel, meu filho mais velho. É claro que não se livrou do bulling do meu pai e principalmente do irmão que não perde uma oportunidade para fazer uma piada.

O dia colaborou, o cume do Abrolhos estava com um visual fantástico e para comemorar as bodas de prata levei um champanhe para brindar. Foi um dia especial para mim, e a presença do meu pai e dos meus filhos foi muito significativo.

Todos esses 25 anos de montanha transformaram minha vida. Hoje vivo em função de estar na montanha, meu trabalho, minha família, meus amigos, tudo gira em torno disso. Não consigo me ver fazendo outra coisa.

Agradeço a Deus por ter proporcionado tudo isso e ter me dado todas as condições de eu aproveitar ao máximo o que ele criou. Ao meu pai por ter me apresentado à montanha e sempre ter me incentivado a seguir como montanhista e à minha esposa Michelle que nos últimos 13 anos esteve ao meu lado na montanha como parceira e sempre me incentivando também.

E que venham as Bodas de Ouro!

Família reunida no Marumbi, Gabriel meu filho mais velho, Rafael e meu velho pai Jorge.

Família reunida no Marumbi, Gabriel meu filho mais velho, Rafael e meu velho pai Jorge.

Galera suando um pouco na trilha da Noroeste.

Galera suando um pouco na trilha da Noroeste.

Aos poucos vencendo os obstáculos do Abrolhos.

Aos poucos vencendo os obstáculos do Abrolhos.

Na primeira janela.

Na primeira janela.

Foto clássica nas escadarias do Abrolhos

Foto clássica nas escadarias do Abrolhos

Comemorando os 25 anos da primeira subida do Abrolhos.

Comemorando os 25 anos da primeira subida do Abrolhos.

Para um dia especial até champanhe na taça.

Para um dia especial até champanhe na taça.

Os Loureiros.

Os Loureiros.

Dia muito especial com meu pai, filhos e Marumbi.

Dia muito especial com meu pai, filhos e Marumbi.